Melody seguia calmamente
pelo corredor ─ contando sempre até dez para manter-se calma ─ enquanto o mesmo
barulho incessante parecia ecoar por todo o prédio. O som constante dos bips já
haviam se transformado em algo familiar desde que chegara até aqui, isso a
assustava um pouco. Não queria se habituar a este lugar, muito menos sentir-se
tão a vontade com o branco gélido e sufocante que estava por todas os lados. Para
onde quer que olhasse o cenário era sempre o mesmo.
Chegou até a porta, sentiu
um calafrio desagradável percorrer o seu corpo. Respirou fundo e girou a maçaneta.
Deu uma rápida olhada para a cama que ficava no centro do quarto rodeada por
aparelhos, de onde vinham os bips. Observou por alguns instantes o peito dele
descer e subir numa respiração lenta, estava dormindo tranquilamente. Ela sorriu
um pouco mais serena. Ignorou os olhos marejados e fechou a porta ao entrar. Atravessou
o quarto e caminhou até a janela, puxou um pouco a cortina e olhou fixamente
para além da vidraça.
Pássaros cantavam
alegremente independente do que estivesse acontecendo a sua volta. Borboletas
iam de um lado para o outro levando suas cores vibrantes e agitando suas asas.
Pessoas caminhavam ao redor de um lago límpido, todos sorriam. O mundo seguia
se curso, constatou.
Enquanto as nuvens sumiam
gradativamente, dando lugar a um belo dia de sol, Melody respira fundo
novamente, sentindo-se um pouco mais relaxada agora. Os últimos dias foram
cansativos, intermináveis e mais complicados do que ela poderia imaginar.
Por um instante seus
pensamentos voltaram para alguns dias atrás, lembrou como chegara até aqui e como
tudo se seguiu depois de ter tomado uma decisão tão repentina.
Juliano a olhava seriamente.
─ Agora, dá para me contar o
que está acontecendo? ─ Juliano perguntou pela terceira vez.
Melody mordeu o lábio
inferior.
─ Nossa que mala enorme! ─
disse se esquivando da pergunta, ao telefone ele já havia ficado bem zangado
apenas por ela pedir para que ele colocasse algumas roupas suas em uma mala.
Tinha que contar o que pretendia fazer e para onde estava planejando ir, mas,
com muita calma. ─ Parece que praticamente todas as minhas coisas estão aqui.
Eu disse só algumas roupas, Julian.
Que exagero! ─ exclamou, e não estava mentindo, ela não pretendia ficar tanto
tempo fora.
─ Ah, desculpe, você não me
explicou. ─ zombou. ─ Aliás, para onde
você pensa que vai? E onde estava até agora? ─ desviou os olhos delas e fitou o
veículo. ─ E de quem é esse carro?
─ Da Bianca. Ela acabou de
ganhar do pai dele, acho que foi presente de aniversário atrasado ou coisa
assim. ─ explicou impaciente. ─ E sobre para onde estou indo... ─ respirou
fundo algumas vezes, anunciou: ─ Rio de Janeiro.
Ele parou estático.
Rapidamente, sem outra opção
e sem querer prosseguir com uma provável discussão, ela contou resumidamente a
conversa que teve com Rafael, e ele apenas escutava a tudo, impassível. No
entanto, as últimas palavras dela foram demais, ele tinha que tomar uma decisão
e se opor, não poderia permitir que ela fizesse uma loucura dessas.
Melody percebeu que não
adiantou muito evitá-la, a discussão começou mesmo assim.
─ Não. ─ foi categórico. ─
Eu não quero que você o encontre, não gosto da ideia.
─ Eu preciso fazer isso. ─
ela contrapôs. ─ Ele faz parte da minha família também. ─ defendeu, a voz
fraca.
─ Seus avós abdicaram desse
direito quando decidiram excluí-la da vida deles. ─ seu tom de voz subiu um
pouco. ─ Sinto muito pela sua avó, Melody, mas não sei por que está assim, nem
a conhecia direito.
─ Juliano! ─ exclamou
horrorizada.
Ele pôs o polegar no nariz e
o apertou, respirou fundo se acalmando.
─ Eu sou a sua família. ─
garantiu. ─ Nossa avó, nossos irmãos e até o nosso pai autoritário, nós somos a
única família que você tem, a que importa.
─ Você não entende, não é? ─
murmurou baixando os olhos. ─ Eu sinto que preciso fazer isso.
─ E tem que ser assim, nessa
pressa toda? Não acha que seria melhor esperar até amanhã, pensar um pouco
melhor sobre a ideia? ─ questionou incisivo.
─ Para que deixar para
amanhã o que se pode fazer hoje? ─ ariscou argumentar com um sorriso amarelo. O
que ela tinha era medo de não conseguir a coragem que adquiriu nesse momento.
Tomou a decisão e precisava visita-lo o mais rápido possível, algo dentro dela
sinalizava isso, como um aviso. Ela não tinha escolha.
─ Tudo bem. ─ vendo que não
tinha outro jeito, ele concordou. ─ Mas eu vou com você.
─ Você não precisa fazer
isso, Juliano. Eu não preciso de uma babá.
─ E o que espera que eu
faça? A deixe viajar sozinha durante a noite? Nem pensar. Não estou pedindo a
sua permissão, Melody. Estou informando que sim, eu vou com você. Se você
precisa tanto fazer essa viagem não posso deixá-la ir sozinha. Eu vou com você.
─ afirmou aproximando-se dela, segurou seu queixo a fazendo encará-lo. ─ Não me
peça para ficar aqui parado vendo você ir direto para uma situação que pode
magoá-la. Eu não posso, e você sabe disso.
─ Eu não vou demorar,
Juliano. São apenas algumas horas de viagem, além do mais, amanhã à noite já
estarei de volta. ─ garantiu, mas ele cruzou os braços. Ficaram se encarando
por longos segundos. Ela riu sem humor, e meneou a cabeça. ─ Certo, você
venceu! ─ falou jogando as mãos para o ar. ─ Você é insuportável, Juliano!
─ Na verdade eu sei ser
persuasivo, é diferente. ─ sorriu vitorioso.
Após colocarem as malas no
carro, começaram uma nova discussão. Juliano se recusava a deixá-la dirigir, e
Melody se negava a entregar as chaves. Às vezes eles tinham divergências
normais, por razões bobas e sem sentindo, como quaisquer irmãos tinham.
─ Já chega, não é uma
proposta Juliano, é um fato concreto. Eu dirijo e se não estiver de acordo você
pode ficar. ─ disparou.
─ Chata! ─ revirou os olhos
e entrou no carro, no banco do carona, amuado.
─Você tem pelo menos um mapa? ─ perguntou preocupado.
Melody mostrou um mapa que
estava sobre o painel e sorriu.
─ E um GPS. ─ informou, mas,
isso não o aliviou muito.
Ele pigarreou e falou em
seguida:
─ Er... Olha só, não cruzei
com ninguém quando fui até o apartamento. ─ comentou. ─ Não acha melhor deixar
um recado ou coisa do tipo na portaria, ou um bilhetinho na geladeira? ─ sugeriu.
Melody comprimiu os lábios e
ponderou por um segundo. A primeira pessoa em quem pensou foi em Rodrigo. Ele
ficaria preocupado com a sua ausência repentina, na verdade ela tinha quase
certeza que a essa altura ele já estava se perguntando onde ela estaria, pois
nem ao mesmo tiveram chance de desmarcar o jantar, havia saído tão rapidamente.
Mas antes de considerar a ideia de subir para falar com ele, sentiu um estranho
frio a percorrer.
─ Ligamos da estrada. ─
disse por fim, dando partida e seguindo o seu destino.
Juliano a olhou como se
estivesse vendo-a pela primeira vez, algo em Melody estava diferente. A garota
frágil que sempre precisou dos seus braços protetores agora estava mais forte.
De certa forma, ele estava vivendo uma divergência interna: estava feliz pelo
crescimento da irmã, mas ao mesmo tempo, não conseguia deixar de se preocupar.
Talvez esse medo se devesse ao fato dele temer o dia em que ela não fosse mais
precisar dos seus cuidados. Talvez, também, fosse esse o motivo por ser tão inflexível
com Rodrigo, ele era um cara legal e realmente amava Melody, Juliano sabia. Mas
não adiantava de muita coisa quando se tratava exatamente da sua irmã.
Existem milhares de mulheres
por aí, por que Rodrigo escolheu se apaixonar exatamente por Melody? Juliano
sempre se questionava. E esse era o problema, ele não escolheu, ela não
escolheu. E tudo se complicava. Fitou a estrada a sua frente por um instante,
pensativo. Analisando um pouco os fatos, concluiu que estava na hora de parar
com a teimosia e ser mais indulgente.
As próximas horas
transcorreram sem mais discussões e a viagem se seguiu tranquilamente. Aos
poucos, as emoções de Melody foram se normalizando, o que permitiu que ela
pensasse com mais clareza sobre sua decisão repentina de visitar o seu avô
materno, guiada por uma necessidade inexplicável. Parando para pensar, percebeu
o quanto fora impulsiva. Sair sem dar nenhum aviso, fora muita
irresponsabilidade da sua parte. Todos já deviam estar preocupados com o seu
sumiço abrupto, principalmente Rodrigo.
Suspirou sentindo um
estranho aperto no coração. Deveria ter escutado Juliano e ter deixado pelo
menos um recado na portaria, ou qualquer coisa para que Rodrigo soubesse onde
ela estava.
─ Me empresta o seu celular?
─ pediu a Juliano assim que ele entrou no carro. Haviam estacionado em um
supermercado 24 horas para comprar alguma comida, ou pelo o que Melody
constatou ao observar o conteúdo na sacola que o irmão trazia, a ideia que ele
tinha de comida. Ela fez uma careta para os pacotes de doritos, batatas fritas
e biscoitos, desaprovando a escolha de Juliano, aceitou apenas o capuchino.
─ Humm, impossível. ─ fez
uma pausa. ─ Er... me livrei dele. ─ ele disse com naturalidade, mexendo mecanicamente
na sacola e desviando o olhar do dela, torcendo mentalmente para ela não fazer
mais perguntas.
─ O quê? Como assim se
livrou dele? Por quê? ─ quis saber, degustando um pouco do líquido quente que
descia suavemente pela sua garganta, e olhando em volta do estacionamento.
─ Gosto dos meus ouvidos. ─
ele resmungou baixinho.
─ Hã?!
Ele fingiu não ouvir, mas
Melody o encarava com as sobrancelhas erguidas, cética. Vendo que não tinha
saída, Juliano resolveu falar de uma vez. Uma hora ou outra sabia que chegariam
nesse ponto e teriam que falar sobre o verdadeiro motivo de ele ter vindo para
o Brasil, achou até estranho ela não insistir no assunto.
Ela
vai querer me matar!, pensou consigo mesmo.
─ Tudo bem. ─ respirou fundo
deixando a sacola com suas guloseimas e o se capuchino de lado. ─ Sabe por que
vim para cá, quero dizer, para o Brasil, para Quatro Rios? ─ perguntou, sem
permitir que ela respondesse, prosseguiu. ─ Eu estava com saudades e também
preocupado, é claro. ─ confessou. Melody notou que ele parecia um pouco
angustiado, já de ele estava mordendo o lábio, e ele nunca fazia isso. ─ Mas,
vim principalmente porque o papai me pediu, ele queria que eu ficasse de olho
em você.
Melody engasgou.
─ Como é que é? ─ perguntou
incrédula.
─ Ele temia que você fizesse
exatamente isso. ─ Juliano tentou se explicar rapidamente. ─ Ir até o Rio de
Janeiro.
Melody se irritou com a
revelação.
─ É bem a cara dele. ─ bufou
encarando o seu irmão mais velho. Estava cansada com o modo como o seu pai a
tratava, ela não era um objeto, ou um ser inanimado que não possuía capacidade
para tomar as próprias decisões. Pelo amor de Deus! Era da sua vida que se
tratava, e estava cansada de agradar a todos, ser perfeita. Decidiu que deveria
tomar as rédeas da situação, o rumo da sua própria vida. Talvez ela tenha sido
ingênua ao pensar que saindo da Itália e mantendo uma certa distância dele as
coisas pudessem melhorar de alguma forma. No entanto, não era assim que
funcionava, fugir nunca fora a resposta, o que Melody precisava fazer era ser
forte e ir em busca das suas conclusões, precisava acima de tudo viver. ─ Não acredito que aceitou me espionar. O que
você fazia, relatava cada passo meu, é isso? ─ gritou, ciente que qualquer um
que passasse por ali poderia escutá-la, ignorou esse detalhe.
─ Claro que não, Melody! ─
exclamou ofendido. ─ Realmente pensa que eu faria uma coisa dessas? Como eu
disse, estava preocupado com você. Nem dei muita importância a isso, ignorei a
maioria dos telefonemas dele desde que cheguei aqui. Talvez isso seja um
problema. ─ suspirou. ─Você sabe que pode contar comigo sempre, Mel. Sou fiel a
você. Somos cúmplices! ─ sorriu torto. ─ Dane-se o papai!
─ Juliano! ─ exclamou,
repreendendo-o. Porém, ele rolou os olhos e ambos gargalharam. ─ Sabe, você
poderia apenas ter desligado o celular, não tinha necessidade alguma de se
livrar dele. O papai não é vidente. ─ explicou um momento depois.
─ Tem razão. ─ aquiesceu. ─
Mas agora é tarde para pensar nisso.
─ Você louco! ─ afirmou
ainda rindo um pouco. ─ E o melhor irmão do mundo, sabia. Eu te amo?
─ Eu também te amo. ─
declarou beijando-a na bochecha.
Permaneceram alguns minutos
ali, conversando distraidamente e no fim, antes que percebesse, ela estava
comendo alguns doritos e, para a sua surpresa, estava gostando. Tinha certeza
que isso se devia especialmente ao fato de não ter se alimentado nas últimas
horas.
─ Quer que eu dirija um
pouco? ─ Juliano se ofereceu, vendo-a um pouco tensa.
─ Não. Eu estou bem. ─
assegurou-lhe sinceramente.
─ Tem certeza que quer fazer
isso? ─ ele perguntou pela décima vez, certificando-se.
Mel reclinou-se no banco, e
relaxou os ombros.
─ Eu preciso. ─ declarou,
dando partida no carro.
≈ • ≈ • ≈
Melody olhou para a casa a
sua frente por longos minutos, antes de tomar fôlego e coragem de ir até lá. Já
passava um pouco das oito da manhã quando ela e Juliano estacionaram na entrada
da casa do seu avô.
A cidade do Rio de Janeiro
era linda, ela constatou. O céu era perfeitamente azul e o sol que nascera no
horizonte transmitindo um calor estranhamente agradável. Melody gostou do clima
um tanto revigorante, era exatamente como as propagandas de empresas de turismos
a descreviam. Mas não viera até ali para apreciar a cidade, ela sabia. Logo
depois de chegarem à cidade hospedaram-se em um hotel, Juliano insistira para
que ela descansasse um pouco, mas Melody estava ansiosa demais e só conseguiu
dormir durante algumas poucas horas. Juliano bem que tentou, mas não teve como
obrigá-la a dormir mais um pouco ao em vez de levantar tão cedo para ir à casa
do avô, já havia sido bem difícil convencê-la a revezar a direção do carro na
noite passada. Então, após um rápido café da manhã, ali estavam eles. Melody conferiu
pela segunda vez o endereço que Rafael havia lhe dado, estava correto. As
batidas do seu coração soavam como uma espécie de contagem regressiva, enquanto
seus olhos continuavam parados na casa a sua frente, Juliano estava ao seu lado
aguardando a decisão que ela tomaria: prossegui, ou dar meia volta e desistir voltando
para Quatro Rios.
Respirou fundo e caminhou em
direção a casa. Olhou em volta perguntando-se o que havia acontecido com a
simplicidade do lar, a casinha modesta branca com varanda e vista para o
pôr-do-sol. Porém essa era uma indagação um tanto hipócrita da sua parte, a
mansão ao estilo gótico em que morava na Itália era bastante exagerada. A casa
∕ mansão a sua frente não era diferente, era uma bela casa e o jardim que a
ladeava era perfeito, colorido, mas ainda assim, extravagante. Talvez as pessoas
devessem parar de confundir bem estar e conforto com luxo e ostentação,
concluiu.
─ Com licença. ─ Melody falou
se aproximando de uma mulher que estava colhendo algumas flores. ─ Oi... hum... er... ─ gaguejou um pouco, sentindo-se um pouco
idiota por isso. ─ Esta é a casa do Dr. Jorge Guimarães? ─ indagou
cuidadosamente. A mulher ergueu o rosto e fitou Melody e Juliano por um momento,
avaliando-os, nunca havia visto os dois antes, franziu a testa.
─ Sim, é aqui mesmo.
Melody mordeu o lábio
inferior, trocando um rápido olhar com Juliano, que a encorajava.
─ Pode me dizer se ele se
encontra? ─ ela perguntou por fim.
─ Não. ─ a mulher respondeu
rapidamente, vendo a expressão de espanto de Melody, ela sorriu desculpando-se,
falou: ─ Quero dizer que não, ele não está em casa. Está no hospital. ─
respondeu simplesmente. Melody sentiu o coração palpitar, como havia acontecido
antes de tomar a decisão de vir até aqui. Engoliu em seco, o título de doutor
se devia ao fato dele ser advogado, e não médico. Seu estômago embrulhou, o
chão por um instante parcele oscilar, ela começou a ficar um pouco apreensiva.
─ Hospital? ─ repetiu, sua
voz saiu num sussurro praticamente inaudível.
A mulher assentiu com um
aceno, alheia a reação de Melody, e limpando a terra das mãos no avental,
acrescentou.
─ Uma tragédia, o Dr. Jorge
sofreu um infarto ontem à noite... ─ parou e manteve os olhos fixos nos dois,
desconfiada, perguntando-se por que dois estranhos estavam tão interessados em
saber sobre o seu patrão. ─ Desculpe, como disse que se chamava? ─ inqueriu
sabendo claramente que nenhum dos dois haviam se apresentado.
─ Meu nome é Mel, esse é o
meu irmão Juliano. ─ gesticulou ligeiramente com as mãos, impaciente. ─ Você
sabe em que hospital ele está internado?
─ Não sei se devo dar essa informação,
trabalho aqui a pouco tempo, mas... ─ fez uma pausa, relutante, porém com um
sorriso contido e educado, prosseguiu. ─ Venham, acho que vocês devem falar com
Eunice. ─ sugeriu levando-os para dentro da casa. Eunice, uma mulher alta e com
uma postura altiva, caminhara em direção a eles assim que entraram na sala de
estar, gesticulando e dando ordens a uma garota que vinha logo atrás dela, logo
depois de uma rápida olhada para eles, Eunice se aproximou.
─ Oi, eu sou... ─ Melody
começou a dizer, mas fora interrompida por ela.
─ A filha de Marissa. ─ ela
disse com um brilho de reconhecimento nos olhos e um sorriso largo no rosto.
Talvez pela emoção da visita inesperada, ela tenha se precipitado e
abruptamente lançado seus braços em torno de Melody num abraço apertado,
deixando-a um tanto receosa pela atitude da mulher, mas antes que percebesse
também a estava abraçando, permanecendo assim por um tempo considerável até
Eunice afasta-se constrangida. ─ Oh, perdão por assustá-la. ─ ela disse, Melody
notou algumas lágrimas caindo dos olhos dela e teve vontade de limpá-las, porém
Eunice mesma já estava fazendo isso. ─ Que falta de jeito a minha. ─
recompôs-se.
≈ • ≈ • ≈
Melody e Eunice conversaram durante
horas, Juliano achou melhor deixá-las a sós e foi para o jardim.
Eunice era a governanta da
casa, trabalhava para a família há anos, começara como babá da sua mãe, e havia
ficado até hoje, pois seus avós, Jorge e Amélia, confiavam nela. Após a morte
de Amélia, Eunice se tornara responsável pela administração de cada detalhe da
casa, como também pela saúde do avô de Melody, que tinha memória seletiva e
esquecia de tomar os remédios propositalmente.
Melody fazia perguntas
aleatórias tentando se manter atualizada, já que não teve a oportunidade de
conviver com eles, e com a sua avô, que, segundo Eunice nunca mais tinha sido a
mesma desde a morte da mãe de Melody, sentia-se culpada, e, principalmente não
conseguia se perdoar pelo modo como tratara a única neta no momento em que ela
mais precisava de apoio. Nesse momento foi impossível contar uma lágrima que
deslizou pelo seu rosto. Melody nunca teve raia da sua avó, ou de nenhum deles,
talvez estivesse ali exatamente para isso, para garantir para o seu avô que ela
não o culpava por nada assim como não culpava a sua avó também. Ela só esperava
ter oportunidade para fazer isso, precisava ir visitá-lo e saber como ele
estava, pois Eunice parecia se esquivar do assunto. No entanto, após muita insistência
sua, a governanta finalmente falou sobre o verdadeiro estado de saúde do seu
avô. Era grave, principalmente tratando-se da sua idade. Além disso, ele
passara as últimas horas dormindo devido as doses de morfina que fora ajudava
na redução das dores no peito.
Despediu-se de Eunice,
perguntando se ela poderia acompanhá-la até o hospital, o que nos próximos dias
se tornara uma espécie de habito nada saudável para ela, pois ficava horas a
fio, fitando o avô dormir, perdendo a noção do tempo. Ela tinha medo de sair de
perto dele e alguma coisa ruim acontecesse, depois da primeira visita voltou
para o hotel e ao retornar no dia seguinte ao hospital descobriu que durante a
noite ele havia sofrido outro ataque cardíaco. Melody ficou arrasada, e não
importava o que Juliano dissesse, ela não iria sair de perto do seu por muito
tempo novamente, pelo menos, não enquanto ele não ficasse bem. Esse
comportamento já estava deixando Juliano preocupado, sua irmã parecia presa
naquele estado de transe se recusando a dormir e se alimentar como deveria, seu
medo era que ela também acabasse ficando doente, e pela a aparência dela não
demoraria; olheiras escuras contornavam os seus olhos, e ela estava ficando
muito pálida.
Melody até tentou
tranquilizá-lo, garantindo que estava tudo bem e ele estava exagerando, mas não
funcionou, nem ela mesma acreditava nisso, sua mente estava uma bagunça e seus
pensamentos confusos, só então lembrou que já fazia três dias que saíra de
Quatro Rios sem avisar a ninguém. Rodrigo foi a primeira pessoa em quem pensou,
precisava falar com ele dizer o que havia acontecido, até tentou ligar para ele,
mas só dava ocupado, e aconteceu o mesmo quando tentou ligar para Caio. Então
resolveu ligar para Dora, sua voz estava um pouco arrastada, mas Dora não
pareceu perceber, Melody notou que ela estava bem chateada pelo o seu
desaparecimento repentino. Melody precisava se explicar, mas não sabia por onde
começar e achou melhor encerrar a ligação, chorando nos braços de Juliano em
seguida.
≈ • ≈ • ≈
Uma leve batida na porta
trouxe Melody de volta ao presente. Juliano colocou a cabeça na porta entreaberta
e em seguida entrou, olhou na direção da cama vendo que Jorge ainda dormia
profundamente, e se aproximou de Melody, abraçando-a.
─ Deveria ter me esperado.
Há quanto tempo está aqui?
─ Pouco, na verdade.
─ Você precisa descansar um
pouco, Mel, está exausta. ─ suspirou e falou calmamente. ─ Seu avô está bem
agora, fora de perigo. Não precisa mais se preocupar.
─ É, eu sei. E é maravilhoso!
─ disse sorrindo aliviada pela primeira vez desde que chegara aqui. Seu avô
finalmente havia recebido alta, e iria em poucas horas para casa, mesmo exausta
ela estava radiante. Durante todos esses dias Melody permaneceu ao seu lado,
orando e pedindo a Deus por um milagre. Os médicos disseram que esperar e ter
fé eram as únicas coisas que ela poderia fazer após seu avô ter sofrido dois
ataques cardíacos seguidos, então se apegou irrevogavelmente a isso, a sua fé em
Deus e na esperança que o seu avô logo ficaria bem.
E foi exatamente o que
aconteceu, um milagre!
Agora ele estava bem e
poderia finalmente voltar para casa, desde que seguisse todas as ordens e
recomendações dadas pelos médicos, como também não poderia deixar de tomar seus
medicamentos corretamente. Dessa parte Eunice prometeu que iria se certificar
pessoalmente. Melody e Juliano assistiram, divertidos, o seu avô fazer caretas
e reclamar com Eunice, que prometera não pegar leve só porque ele estava
deitado em uma cama, indefeso. Jorge não era o homem sério e ranzinza que
Melody imaginava, na verdade ele era hilário, por falta de termo mais
específico.
Na primeira vez que Jorge
acordou, Melody ficou relutante em falar com ele, pois os médicos haviam lhe
dito que deveriam evitar emoções fortes, já que o coração dele estava
duplamente mais frágil, ela não queria que ele piorasse. Mas Eunice garantiu
que ele ficaria feliz em vê-la, então, ela e o avô tiveram o reencontro que
realmente deveriam e mereciam: repleto de lágrimas e risadas contidas.
Mais uma vez uma batida na
porta chamou sua atenção, arrancando-a dos seus devaneios. Melody se virou e
viu o Dr. Lucas entrar segurando uma prancheta na mão, Juliano rapidamente
apertou os braços em volta de Melody como se ela fosse fugir ou algo do tipo,
na verdade essa era sua mesma reação desde que conhecera o médico, ele era
jovem e bonito, e Juliano sabia exatamente por que ele demostrava tanta
gentileza para com sua irmã. Com um sorriso brando e evitando olhar na direção
de Juliano o médico só queria avisar que a alta de Jorge já estava assinada.
Melody sorriu e agradeceu por terem cuidado tão bem do seu avô.
Cinco horas depois os irmãos
Angnel já se preparavam para deixar a Cidade Maravilhosa. Melody pretendia ficar até no Rio o final de
semana enquanto o seu avô voltava a sua rotina habitual e aproveitar a sua
companhia o máximo que conseguisse. No entanto, algo a estava deixando
inquieta, ela precisava voltar, não tinha a menor ideia como estavam as coisas
e como os seus amigos estavam lidando com a sua falta de notícia, além disso,
ela não havia entrado em contato novamente.
Melody respirou fundo. Se
despedir nunca é fácil, principalmente de pessoas que ela havia aprendido a
amar em tão pouco tempo. Eunice, com lágrimas nos olhos, se aproximou dela com
um objeto em mãos.
─ Tenho certeza de que
Marissa gostaria que você ficasse com isto. ─ disse sorrindo com a voz
embargada, e entregando o que Melody concluiu ser um álbum de fotos. ─ Foi um
prazer finalmente conhecê-la, querida.
─ Obrigada, Eunice. ─ agradeceu
abraçando-a demoradamente, seu coração apertou na hora de dizer adeus, mesmo
que provisoriamente. ─ Eu volto assim que puder para visitá-los. ─ prometeu,
afastando-se um pouco. ─ Cuida dele, direitinho, por favor! ─ pediu
referindo-se ao seu avô, que estava na varanda acenando para ela, eles já
haviam conversado e se despedido alguns minutos antes.
─ Cuidarei, não se preocupe.
─ garantiu.
─ Pronta para ir? ─ Juliano
perguntou.
Dando mais uma rápida olhada
para casa, falou:
─ Sim.
≈ • ≈ • ≈
─ Você está bem? ─ Juliano
sondou assim que entraram na garagem do prédio em que moravam. A viagem havia
sido silenciosa e Melody vagava entre a consciência e a inconsciência, sentindo
que desmaiaria a qualquer momento.
─ Sim. ─ afirmou, mas seu
irmão não acreditou, e ergueu uma sobrancelha em desafio. ─ Mais ou menos, só
um pouco cansada. ─ suspirou. ─ Vou ficar bem melhor quando dormir pelas
próximas... trinta e seis horas. ─ riu. ─Não se preocupe. ─ bocejou, encostou a
cabeça no ombro de Juliano quando entraram no elevador e fechou os olhos, tudo
o que mais queria nesse momento era dormir.
Chegando ao seu apartamento,
buscou as chaves dentro da bolsa, mas não conseguiu colocá-la na fechadura e a
deixou cair, seus reflexos estavam exageradamente lentos. Juliano, com um longo
suspiro, abriu a porta e franziu a testa em seguida, constatando que talvez
tivessem chegado em uma péssima hora, já que de repente todos que estavam na
sala pararam a provável discussão que estavam tendo e encaravam ele e Melody,
com expressões faciais variadas.
─ Mel?! ─ Rodrigo exclamou
sobressaltado ao vê-la entrar no apartamento depois de quase uma semana fora.
Um pequeno redemoinho se formava em seu estômago. Uma parte sua ainda estava
com raiva por ela ter desaparecido sem dar explicações, no entanto, outra
parte, estava feliz e aliviada por vê-la ali. O único problema era que, a parte
que ele não queria, imperava nesse momento.
─ Nossa, que recepção! ─
falou Juliano para ninguém em particular. Analisou rapidamente a aparência de
todos ali, e como estavam vestidos, trocou um rápido olhar com Melody e
sussurrou ao seu ouvido. ─ Entramos no apartamento errado?
Melody ignorou a sua
pergunta, estava mais intrigada com a forma como Caio, Dora e Rodrigo a
encaravam: como se tivessem acabado de ver um fantasma. E também, é claro, com
a forma como estavam vestidos, seus olhos analisaram fixamente Dora, ela estava
estonteantemente linda, e logo depois pararam em Rodrigo que não desviara os
olhos dela nem um segundo. Ele estava perfeito vestindo um smoking, um
verdadeiro príncipe de contos de fadas, mas por alguma razão, chegou a
conclusão que preferia o modo casual com ele se vestia diariamente.
Piscou os olhos sonolentos e
vendo que ninguém falava nada, apenas continuava encarando, ela perguntou:
─ Aconteceu alguma coisa?
O silêncio permaneceu por
alguns minutos.
─ O que... O que você está
fazendo aqui? ─ Rodrigo gaguejou com os olhos fixos em Melody, seu olhar era de
magoa e incredulidade. Por alguma razão ela sentiu um calafrio estranho nesse
instante.
─ Como assim o que eu faço
aqui? ─ perguntou confusa. ─ Eu moro
aqui, esqueceu? O que está havendo afinal? ─ voltou a perguntar com a voz um
pouco mais firme.
Dora e Caio trocaram olharem
rápidos, enquanto Rodrigo apertava as mãos em punho, tentando se acalmar, mas
não deu muito certo.
─ Você sumiu, foi isso o que
aconteceu! ─ Rodrigo esbravejou. ─ Afinal, onde você estava esse tempo todo, se
é que pode compartilhar conosco? ─ zombou.
─ Vamos com calma. ─ Juliano
alertou não gostando do jeito nem do tom com o qual Rodrigo falava com a sua
irmã. ─ Que tom de voz é esse com a minha irmã? Alguém pode explicar o que está
acontecendo aqui? ─ perguntou seriamente, apertando firmemente a mandíbula.
─ Ora, cale a boca! É tudo
culpa sua. ─ Rodrigo declarou rispidamente, com o dedo em riste na direção de
Juliano. ─ Você sempre deixou muito claro que eu não sou bom o bastante para a
Mel. Eu não sei qual é o seu problema, o verdadeiro
problema. ─ enfatizou, com insinuação. ─ Mas quer saber, eu acho esse seu ciúme
doentio.
─ Rodrigo! ─ exclamou
horrorizada com o comportamento dele. ─ O que deu em você?
Melody sentiu a cabeça
latejar e a sala girar. Isso tudo era
muita loucura! Talvez tivesse em uma espécie de sonho bizarro, ou perdida
em um mundo paralelo maluco. Tudo o que precisava fazer era acordar.
─ Achávamos que vocês
tivessem... voltado para a Itália. ─ Dora explicou calmamente. ─ Quando cheguei
em casa vocês não estavam, nem as suas coisas.
─ Bem, foi uma conclusão
obvia, não acham? ─ Caio completou.
Melody balançou a cabeça.
─ Eu precisava resolver um
problema importante, não tive tempo para avisar. Depois outras coisas
aconteceram. ─ respirou fundo. ─ Desculpe, eu não tive a intenção de
preocupá-los. ─ aflou honestamente.
─ Não teve intenção? ─ Rodrigo
repetiu ceticamente. ─ Você faz ideia do que eu passei sem saber o eu tinha
acontecido? De uma hora para outra você desaparece sem deixar sequer um
bilhete, e volta com um mero pedido de desculpas? ─ disse com rispidez e um
olhar arredio.
Os últimos dias foram
cansativos, fazendo-a ir até o seu limite. Havia derramado mais lágrimas do que
pretendia, e mesmo assim, isso não impediu que mais uma torrente ameaçasse
molhar o seu rosto, mordeu o lábio para contê-las.
─ Sinto muito, Melody. Me
aguentei o quanto pude, mas isso já foi longe demais. ─ ouviu a voz de Juliano
dizer, distante, mas parecia que o mundo a sua volta estava em câmera lenta.
─ Juliano, o que você... ─
Mel começou a dizer, porém sem aviso e de maneira abrupta e zangada, Juliano lançou
o punho diretamente no rosto de Rodrigo, que cambaleou até cair no sofá. ─ Juliano! ─ ela exclamou assustada pela
explosão de fúria do irmão.
─ Ai meu Deus! Por que você
fez isso? ─ Dora gritou indo rapidamente ao encontro de Rodrigo.
Por um minuto a sala ficou
em silêncio, Mel observou a expressão no rosto do irmão suavizar aos poucos.
─ Ele estava descontrolado.
Alguém tinha que acalmá-lo de alguma forma. ─ falou defensoramente, como se
fosse obvio. ─ Funcionou, pelo menos. ─ deduziu.
Rodrigo massageou o queixo,
com uma expressão de confusão, sacudiu a cabeça.
─ E você adorou fazer isso.
─ afirmou ele lançando um olhar petrificante para Juliano.
Melody se encolheu. Preocupada,
sem se mover, analisou minuciosamente o rosto de Rodrigo, pelo menos a agressão
idiota do irmão não provocara grandes danos.
─ Nem tanto. ─ Juliano
garantiu fazendo careta e, assim como Rodrigo, massageou a mão que acabara de
provocar um ato de violência. ─ Agora senta aí e mantenha a calma, por que se
você levantar a voz para a minha irmã mais uma vez, aí sim, vou adorar quebrar
a sua cara. ─ avisou, sério.
Olhando para Melody, Rodrigo
sorriu. Não o sorriso encantador que sempre fazia o coração dela bater mais
forte, dessa vez era um sorriso debochado, acusatório.
─ Você não é a garota que eu
pensei que fosse. Seu irmão consegue te moldar direitinho. ─ ironizou. ─ Você
sempre faz o que ele quer.
Tremendo e com os olhos
marejados, Melody olhou para cada rosto ali presente. Isso só pode ser um pesadelo, pensou frustrada. Era impressão sua
ou a sua cabeça estava zunindo? Apertou firmemente a têmpora direita e soltou
uma risada áspera.

─ Eu estou cansada de tudo
isso, sabia? ─ falou diretamente para Rodrigo. Sua voz saiu estranha, fraca,
sem vida. Ela estava magoada e sem energias para discursões, mas estava ainda
mais exausta de ver o comportamento de Rodrigo neste momento. ─ O meu irmão não
é o problema. Confesso que o Juliano pode ser impossível algumas vezes, e eu
sei que ele vem se esforçando ao máximo para me convencer a ficar longe de
você. Mas eu não me importo, eu o amo mesmo assim, ele é muito importante para
mim. ─ afirmou, a essa altura era impossível conter a enxurrada de lágrimas que
caiam pela sua face. Ela não se importou com isso, queria desabafar e acabar
logo com isso. ─ E quer saber o motivo dele ser tão especial? ─ perguntou, não
esperando resposta, gritou histericamente. ─ Ele sempre esteve ao meu lado quando
eu mais precisei. Ele sempre pensa primeiro em mim e na minha felicidade do que
nele mesmo. Foi ele quem sempre segurou a minha mão depois de um pesadelo, e
cantou para eu dormir quando erámos crianças. Foi ele quem ficou ao meu lado, sem
questionar, quando um imbecil mimado e arrogante partiu o meu coração. Foi ele
quem me ajudou a fugir do meu próprio pai que decidiu fazer escolhas no meu
lugar e eu não tinha a menor chance de ir contra ele. E foi sempre ele. Então,
não aja como se o conhecesse. Não pense que entende o nosso relacionamento,
porque está claro que você não entende. Sinto muito se você não é o centro do
universo e eu não sou a garota perfeita que você idealizou. Eu passei os
últimos dias aflita em um hospital enquanto o meu avô que eu nem conheço
direito estava deitado em uma cama entre a vida e a morte. Então, perdoe-me se
não tive como avisá-lo onde eu estava. ─
sua voz era apenas um sussurro quando terminou de falar, e a respiração
acelerada.
O silêncio foi total. Todos
ficaram estáticos sem saber o que dizer. A explosão de Melody pegou a todos de
surpresa, até mesmo Juliano não sabia se ficava orgulhoso ou com medo, nunca a
vira tão magoada e irritada.
Melody tentava se acalmar. Não
era assim que imaginava sua chegada. Ela estava ciente de que ficar sem dar
notícias fora irresponsável e insensível, não podia culpá-los por estarem
chateados com ela. Era aceitável até. Mas, o único problema estava no
comportamento de Rodrigo. Quantas vezes ela desejou que ele estivesse ao seu
lado naquele hospital? Quantas vezes esperou que ele simplesmente a abraçasse e
dissesse que tudo ficaria bem? Não foi justo a maneira como ele a tratou e ao
seu irmão enquanto sua cabeça ameaçava explodir. Ela estava tentando
compreendê-lo. Seria difícil, ela pensou, se ele também decidisse sumir por
dias sem dar uma explicação concisa, mas nunca seria capaz de dizer algo que
pudesse magoá-lo.
Rodrigo a fitou fixamente.
Engoliu em seco, percebendo o quanto havia sido rude. Seu rosto que antes
mostrava uma expressão de traição, agora havia desmoronado completamente, e
tudo o que ele mais queria nesse momento, ao vê-la tão frágil, era abraçá-la
forte.
─ Mel, eu não... ─
imperceptivelmente caminhou na direção dela, no entanto, Melody recuou, cruzou
os braços e os apertou firmemente, tentando se proteger.
─ Podem nos dar licença, por
favor? ─ Mel pediu após um suspiro.
Caio e Dora se entreolharam
rapidamente e logo em seguida estavam indo na direção na porta. Juliano, no
entanto, permaneceu parado onde estava mostrando que não iria a lugar. Com um
olhar cúmplice, Melody disse ao irmão que estava tudo bem. Ele respirou fundo,
franziu a testa e lançou um olhar de advertência para Rodrigo.
Os dois permaneceram em
silêncio por um longo tempo, apenas olhando para qualquer outro lugar que não
eles mesmos.
Rodrigo foi o primeiro a
quebrar o silêncio.
─ Desculpe, eu passei dos limites,
agi como um idiota. Mas, como queria que eu reagisse? Você sumiu, simplesmente
desapareceu sem deixar rastros, eu fiquei perdido sem saber o que pensar. ─ Mel
ficou parada vendo-o lutar com as palavras que pareciam estar sufocando-o. ─ Fiquei
com raiva por ter me apaixonado por você, e ter confiado em você. Eu não sabia
o que pensar nem o que fazer, só de imaginar que nunca mais a veria novamente
meu peito apertava. Eu fiquei desesperado, Mel.
Ela balançou a cabeça,
cética.
─ Então resolveu atacar a mim
e ao meu irmão? Você agiu com egoísmo, Rodrigo. ─ falou com a voz embargada. ─Nunca
esperei uma reação dessas vinda de você. ─ declarou. ─ Estou decepcionada.
─ Eu não queria dizer
aquelas coisas. Perdoe-me, por favor. ─ fez uma pausa. ─ Eu não sabia sobre o
seu avô, como poderia se você não disse nada? ─ ele argumentou.
─ A questão não é essa, e
você sabe. ─ contrapôs suspirando, exausta. ─ Rodrigo, eu te amo. Mas, talvez o
Juliano esteja certo. Isso não vai funcionar, eu e você. Eu não posso viver em
uma montanha-russa emocional, isso é irracional. ─ prosseguiu. ─ Você não
confia em mim. Essa já é a segunda vez que você toma uma decisão precipitada
por uma ideia mal formulada ao meu respeito, e eu não sei o que pensar sobre
tudo o que acabou de acontecer aqui. Não acredito que você pensou que eu iria
embora dessa maneira sem dar nenhuma satisfação. Eu pensei que você que
conhecesse um pouco melhor do que isso. ─ o fitou. ─ Pensei que o que tínhamos
era especial.
─ E é.
─ Não. Não é, não. Eu sei
que tive culpa por não ter falado onde estava e nem dado explicações sobre o
meu sumiço, mas a forma como você me tratou... me deixou assustada. ─
confessou. ─ Eu não quero continuar com essa conversar. Vá embora... ou fique,
faço o que quiser. ─ disse indo em direção ao seu quarto.
─ Mel, precisamos
conversar... ─ ele disse, segurou-a pelo braço, impedindo-a.
─ Não, não tenho mais nada a
dizer.
Ele a encarou sentindo uma
lágrima cair.
─ Vamos terminar assim? ─
perguntou angustiado.
─ Nunca começamos de
verdade. ─ replicou com um nó na garganta. ─ Rodrigo, os últimos dias foram...
cansativos, eu preciso descansar. ─ disse tentando desviar-se do assunto e fugir
do olhar dele, encarou o chão, mas não tentou se desvencilhar do toque dele.
─ Eu não posso perder você.
─ ele sussurrou. Aproximou-se e pegou o rosto dela entre as mãos. Melody
prendeu a respiração sabendo exatamente o que viria a seguir. Borboletas
esvoaçavam freneticamente em seu estômago, sentiu a boca ficar seca, e sua
mente ficou em transe.
Rodrigo deslizou
delicadamente a mão pela face de Melody, fazendo o seu coração disparar
rapidamente. Seus rostos se aproximaram involuntariamente, como se um imã os
atraísse para mais perto. Os olhos de ambos permaneceram presos um no outro o
tempo todo.
Melody fechou os olhos e se
inclinou, esperando, e por um instante Rodrigo hesitou, em dúvida, avaliando a
reação dela, ou apenas estendendo o momento da expectativa. Com o coração
descompassado e a respiração entrecortada, Rodrigo colou seus lábios suavemente
aos dela, selando o beijo. Era
exatamente como ambos esperavam que fosse: um toque suave, delicado, tranquilo,
mas não menos apaixonado, cúmplice.
De repente foi como se o
mundo inteiro desaparecesse. Eles não estavam mais no apartamento ou em
qualquer parte do planeta. O espaço em volta deles era etéreo, mágico, feito
somente para eles. Melody entrelaçou os dedos no cabelo dele, puxando-o para
si, temendo que tudo não passasse de um sonho e que a qualquer momento
acordasse, Rodrigo enlaçou os braços em volta da sua cintura, também desejando
que o tempo parasse.
O beijo cessou, mas a
sensação de estarem flutuando permanecia entre eles.
Passou-se um minuto até ela
consegui abrir os olhos e fitá-lo, sentiu o pulso acelerado e o rosto corado. Rodrigo
segurou o seu rosto a centímetros do dela e pousou o polegar sobre a sua bochecha
fazendo pequenos círculos, sorriu, e logo depois, encostou a testa na dela suspirando.
─ Sei que você não é
perfeita, Melody, ninguém é. ─ garantiu. ─ Mas são as pequenas imperfeições que
acabam tonando uma pessoa perfeita para alguém. E você é perfeita para mim, eu
te amo. ─ murmurou.
─ Eu também te amo, Rodrigo.
─ sussurrou baixinho.