17 de setembro de 2013

27 - Entre circos e palhaços

Uma história em quatro mãos - Laços do coração

Caio viu Rodrigo ir buscar água pela saída lateral e demorou pra sair de lá, comoa parte musical já tinha acabado ele resolveu ir procurá-lo, e viu Mel sair com uma cara nada boa, ele olhou pra trás pra ver onde estava Juliano e ele estava com Bia um tanto inquieto pelo também desaparecimento momentâneo da irmã, Caio tinha apenas alguns segundos pra saber dela o que houve antes dele se aproximar.
− Mel o que está acontecendo? Que cara é essa e cadê o Rodrigo? Responde rápido que teu irmão está vindo.
− Saiu pelos fundos, não quero falar sobre isso. Vai atrás dele, Caio. − Ok, obrigado. − ele voltou pro balcão e falou rapidamente com Carlos o dono do bar. - Carlos, segura essa pra mim irmão. Guarda os instrumentos do Rodrigo e meu, amanhã viemos buscar.
− O Rodrigo tá bem? Pensei que ia tocar mais uma, fizeram um belo show hoje. Espero que repitam mais vezes. Vai lá que eu seguro as pontas aqui.
− Obrigado Carlos, fui!
E saiu em disparada pela porta dos fundos caminhando pra noite fria, não fazia idéia de que lado seguir por sorte era uma linha reta com apenas uma esquina a virar, se por acaso ele seguiu reto ainda daria pra avistar, com a pouca neblina estava dificultando a vista. Caio pediu a Deus que o encontrasse, e de repente seu desespero se acalmou e ele simplesmente soube que encontraria o amigo, no lugar mais improvável e apropriado possível aos pés de uma cruz se debatendo em questionamentos.
− Como você consegue nos perdoar? - perguntou Rodrigo para a cruz.- Por que Ele escolheu nos amar Rodrigo. Não importa se vamos pecar de novo, Ele sabe se o nosso arrependimento é verdadeiro, e isso basta. Ele sabe que somos fracos, que mesmo tentando não cometer o erro acabamos fazendo.
Rodrigo não se virou em direção de Caio e ele deixou o amigo sentir o que precisava sentir. Viver essa experiência de se encontrar com o único amor que vale a pena. E em lágrimas de alegria ele se aproximou e abaixou ao lado do seu amigo para enfim olhá-lo nos olhos.
− Ei, Ele vai ajudar, Ele sempre nos ouve. A nós cabe ouvir e obedecer, tentar e não parar de tentar fazer dar certo. Ele é o caminho certo, a verdade que liberta e o estilo de vida mais saudável pra viver porque tem esperança e certeza do eterno. E mergulhados nesse amor que estende essas lindas opções podemos sempre pedir a Ele o
socorro na hora da dor, da dúvida e Ele sempre vai nos ouvir, Rodrigo, sempre!
− Você faz parecer tudo tão tranquilo. Tem uma tempestade dentro de mim, sei que pra Ele foi infinitamente pior e acredito que fez por amor, mesmo não fazendo sentido, fazer isso por mim.
− Faz sentido pra Ele e entende que o absurdo é rejeitar essa mão amiga, esse amor imenso e profundo?
− Entendo, eu quero isso. Não aguento mais carregar esse peso.
− Perfeito! - falou Caio sorrindo largamente entendendo que esta era a confissão de Rodrigo pra Deus, pegou sua mão e a ergueu frente aos seus olhos como se fosse uma queda de braço e falou com uma alegria esfuziante com os olhos brilhando de felicidade - Cara, entende o que isso agora? Tu acaba de ser adotado pelo melhor pai do mundo! Tu é meu irmão no céu e na terra e não há nada que possa nos separar do amor que está em Cristo. Essa certeza é linda, não é?
− É! - falou Rodrigo rindo junto com ele e o puxando pra um abraço apertado, selando uma união celeste e real, de sangue e alma, entre irmãos.


• • • •


Quatro horas mais tarde, Caio levanta da cama havia tido um pesadelo com Luísa, na verdade fora uma muito lembrança ruim. Algo que ele ainda não sabia estar plenamente resolvido. Estava escuro e chovia forte, ele a encontrara enfim, perto da árvore, ensopada e encolhida tremendo, tirou o casaco da mochila e a cobriu.
− Você está gelada Luísa. - falou Caio pegando ela no colo, seus lábios estavam roxos. − Vou te levar pra fazenda do meu tio é aqui perto, me abraça pequena. Logo vai estar aquecida. − ela se agarrou a ele com o pouco de forças que tinha.
Chegaram a casa do tio de Caio e ele a entregou pra Sandra que lhe deu um banho quente e roupas secas. Enquanto Caio vociferava na cozinha. Estava aliviado por a ter encontrado, mas com ódio daquele homem que a havia maltratado. Mesmo aos 15 anos tinha peito e coragem de encarar um homem adulto, com seus 1,78cm e a fúria nos olhos verdes tudo era possível, quando ouviu aquela voz rouca e fraca.
− Caio, não faz nada, por favor.
− Como assim, Luísa?
− Eu estou bem, você já fez mais do que o necessário. Não sei porque faz tudo isso por mim.
−Não sabe? Jura? − falou ele baixando as sobrancelhas e lhe encarando nos olhos que teimavam em não o olhar de volta.
− Não Caio, essa história de…
− De ser completamente apaixonado por você desde que eu tinha 7 anos? É uma história tão difícil de acreditar assim?
− É loucura, é ilusão. E você faria qualquer menina tão feliz, se eu pudesse...
− Para de pensar e sente. - falou ele a puxando pra si e a beijando ternamente ela não resistiu e se deixou envolver por ele, pela ternura, pelo beijo que acalmava e afastava o mal mais escuro dentro dela. Caio a tinha ali frágil em seus braços sua pela primeira vez, era tão real quanto absoluto, o amor de sua vida.
Ele acordou apavorado com essa lembrança. O fato de Luisa ter voltado pra sua vida complicava as coisas. Ele sentia que não era forte suficiente pra manter sua promessa de ser seu amigo. Ela ainda era importante pra ele, ela sempre fora. A interrogação com Dora era outro problema, ele praticamente colocara nela uma faixa de proibido, sem acesso, por isso mudara os planos de um jantar para um passeio inocente no parque, dava pra ter o controle sobre isso. Foi para o chuveiro e acordou Rodrigo que costumava não ser uma flor de criatura pela manhã e principalmente quando o acordavam, na segunda batida na porta ele entrou e foi recebido com um travesseiro na cara.
− Passa amanhã que eu to dormindo!
− Preciso de ajuda!
− Agenda pra mais tarde agora to ocupado.
− Rodrigo é hoje que eu vou sair com a Dora.
− Hum! E eu com isso? Você falou que é só amizade e pelo bem da menina espero que seja só isso mesmo.
− É… eu também. - falou Caio em ré menor fazendo Rodrigo despertar por completo.
− O que está pegando Caio?
− Tive um sonho meio chato. Carol falou que eu tenho que cortar o cabelo e fazer a barba, não conheço nenhum barbeiro por aqui.
− Verdade que tu tá precisando.
− Beleza, irmão e você não me fala nada. Precisa uma garota de 8 anos pra me dizer que eu to igual um mendigo por aí.
− Olha só eu sou teu irmão só há 5 horas e já tenho que ter responsabilidades?
− Ah vacilão! Levanta logo e me leva no barbeiro.
−Vai fazer café que eu acordo e te levo.
− Tá bom, a Maria já vai fazer café pra você, tá? - falou ele irônico devolvendo o travesseiro com toda força na cabeça de Rodrigo.


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Mais tarde ao passar pela ponte do belo parque de 4 Rios e avistar Dora sentiu que talvez fosse tarde demais pra por freios em alguma coisa, mas ele tentaria não agir sem pensar, não era o seu forte, costumava a ser impulsivo demais, mas ele tentaria e ela estava linda, simplesmente linda.
− Tá linda! - ele falou prendendo a respiração dela e respondendo seu questionamento interno. Ela estava nervosa não queria sorrir, mas a linha se formou em seus lábios antes que pudesse impedir, refletia tranquilamente o sorriso que ele já havia posto em seu coração.
− O que você está aprontando Caio?
− Normal, eu sempre apronto. Vem comigo que hoje tem tanta coisa linda aqui pra ver. Me mostra teu lugar favorito. Lembra que eu sou novo por aqui. Me guia.
− Então não tem nada em mente?
− Nada que deseje revelar agora. Neste lindo sábado fresco de sol, embora o inverno já se avizinhasse por essas bandas fazia um calor ameno, com brisa fresca. Havia uma apresentação circense naquele dia e tudo estava muito cheio de vida e cor, malabares pirofágicos, mágicos e palhaços franceses, o que era muito engraçado, pois não tinha absolutamente graça nenhuma neles. Ciganas que liam mãos e dançarinas do ventre. No campo aberto famílias fazendo piquenique e alguns casais.
Caio tinha porte de homem, altura, cheiro, jeito, mas às vezes parecia um menino e a mistura o tornava irresistível na maioria das vezes. Eram só eles dois, era um encontro, mesmo que quisesse que não. Ele a deixava em dúvida e na margem dos acontecimentos na maioria das vezes, tentando quebrar o clima de proximidade mais íntima.
− Sinceramente, a última vez que vim a este parque eu tinha uns dez anos.
− Que bom, o olhar da criança sobre as coisas é sempre mais interessante.
− Isso porque você é uma criança grande.
− Às vezes… eu simplesmente gosto de ver a vida do jeito simples. Vi dores e
coisas muito duras quando pequeno, não é que eu tente esquecer, eu só tento curar. - e sorriu.
− Tem muita coisa que eu não sei sobre você, não é?
− É, e hoje é seu dia pra descobrir. Caio aberto a perguntas, mas primeiro se divertir.
− Tudo bem! − exclamou ela exageradamente revirando os olhos. − Vem comigo menino!
Era assim que ele gostava dela, linda, leve, alegre, ele ainda podia ver a dor da perda em seus olhos, ele ainda via a menina órfã tentando afofar a dor no peito e camuflar tudo o que estava sentindo só pra não incomodar, mas era preciso seguir em frente e ele a ajudaria a ir onde ela quisesse. Parecia uma garotinha com aquele arco e vestido florido, um encanto perturbador. Ela o levou para uns postos divertidos onde se podia ganhar brindes, acertando o alvo, eles se revezavam, ele tinha boa mira e acertou vários para acumular pontos para ganhar o brinde, mas errou uns dois. Dora errou vários de propósito. Ela morria de rir quando ele errava e aplaudia quando alcançava.
− Caramba! Você como um bom cavalheiro devia me deixar ganhar. − zombou ela.
− Não sou esse tipo de cara.
− Ok, então. Me dá licença agora. - ela mirou e acertou de primeira o alvo mais difícil. − Essa é a minha "magoozinha"! Me lembre de nunca provocar sua ira, acertaria minha cabeça de primeira.
− Não é! - concordou ela. - Mas, como você tem sido um bom menino a tia Dora pode até te dar o brinde. Moço, aquele ali. − disse ela apontando para o macaco fofo amarelo caramelo e marrom com um sorriso travesso no rosto.
− O macaco? − perguntou ele com um sorriso divertido.
− Sim, e o nome dele é George, o curioso. − ela o pegou e deu a Caio. − Toma eu acho ele simplesmente a sua cara.
− Tenho cara de macaco?
− Não, é curioso mesmo. Sempre muito curioso. - ela saiu saltitando na frente dele. - Vem, tem algodão doce ali.
− Já vou. - ele falou sorrindo ao vê-la correr pro moço com aquelas madeixas morenas esvoaçantes no ar. Chegou perto dela, e quando percebeu ela e o homem havia entrado num embate pelo preço do algodão doce superfaturado.
− Como assim o senhor quer me cobrar o triplo do valor no algodão doce, até
onde eu sei o preço do açúcar não subiu tanto! - reclamou ela balançando os braços. Caio conhecia a posição de briga de Dora.
− Calma, Dora! O que houve? - perguntou ele, vendo que o homem estava impaciente com ela.
− Esse senhor quer me convencer que o algodão doce tá nesse preço absurdo. Como pode pagar tão caro em algo que estraga os dentes.
− Espera aí, toma moço! Vou querer dois. - falou ele lhe dando o dinheiro e se metendo entre os dois afastando ela do homem. Ela bufou e foi pra longe dos dois ele foi atrás dela que estava visivelmente frustrada.
− Não acredito que você pagou, invalidou completamente meu protesto! Acha que eu estou errada? Não é só por 0,50 centavos. Meu salário de babá não cobre esses luxos, não.
− Vem cá senta aqui. − falou ele tentando acalmá-la, ela ficava linda brava e melhor ainda quando não era com ele. Ele foi até a carrocinha de cachorro quente do lado do banco que eles estavam e pediu um sache de sal.
− Pra que você quer sal, Caio? Sal? Você é esquisito mesmo.
− Vou te ensinar uma coisa. Abre a mão. − ela abriu ele pôs um pouco de sal sobre a mão dela. − Agora passe sal nos lábios. − ela o encarou desconfiada e passou. − Agora tá sentindo ele arder a pele? − ela acenou que sim − Prova, agora o algodão.
− Só você mesmo, mas isso é legal. Tem gosto engraçado, mas é tipo um alivio, delícia.
− Sim! É o mesmo com a raiva que você tem do moço. Agora você está mais feliz com o algodão doce. A vida tem dessas coisas salgadas e doces, que agregam valor uma a outra. Nunca vamos valorizar as doces se antes não provarmos as salgadas. É o que agrega valor, moça.
− Ok, Caio o conselheiro. Isso é pra eu aprender a não brigar por meus centavos ou pra ver que a vida é mais doces que minhas tristezas?
− Exatamente, narizinho.
Ela franziu o nariz e sorriu pra ele, eles estavam bem próximos de ombros lado a lado e aquele gesto dela o enterneceu, ela estava lidando melhor do que ele esperava. Podia relaxar que ela certamente floresceria pra vida com ou sem a sua ajuda. Ele, particularmente preferia com.
− Então, Dora, eu já percebi que embora amemos a pequena Carol, ser babá não é o que você quer da vida. O que tem em mente, vestibular, concurso público?
− Tenho a maior cara de concurseira, né? São esses óculos. - falou ela devolvendo eles ao seu lugar que sempre escorregavam pelo nariz fino e delicado. - Mas a ideia de bater ponto todo dia num mesmo lugar trabalhando por 15/30 não me atrai. Não passei em dois vestibulares, me sinto meio burra sabe?
− Por não ter passado?
− Claro! Cheguei até a fase B, mas não passei. Tentei coisas completamente opostas e não passei em nenhuma.
− Tentou pra quais cursos.
− Jornalismo e Letras.
− Não são tão opostas, você gosta de escrever e de ler.
− É mais eu pensava em jornalismo mais como algo investigativo ou algo mais empolgante assim e letras pra dar aula, já que lido com crianças. Eu realmente não sei. Fazer aquilo que estou acostumada ou algo completamente diferente.
− Algo empolgante? Que tal ser atriz, não que você tenha dom, haja visto suas atuações pro Juliano, mas pode aprender.
− Ai seu peste! − falou ela o empurrando e rindo, ele riu e ela gostou muito do som que reverberava nela também era contagiante, desfazia sua raiva automaticamente.
− Ok, tudo bem. Confesso que também preciso voltar a estudar, e passar pra uma pública porque pagar uma faculdade particular está fora do meu orçamento. - falou Caio.
− E pretende prestar pra que? Sei lá, segundo você eu não presto pra nada. - riu-se ele.
− É mesmo, mas vai que você tem sonhos. Tem que incentivar. - falou ela curtindo com a cara dele.
− OK, Dora! Música ou psicologia.
−Ainda tá fazendo piada?
− Não, estou falando sério.
−Humm, é você dá bons conselhos, mas isso é uma profissão bem pesada.
− É sim, mas gosto de ouvir as pessoas e se puder ajudar, melhor.
− Você é um bom amigo sabia. Pela primeira vez Dora confessa: foi um prazer fazer amizade com você.
Adoro quando fala na terceira pessoa. Então, podemos estudar juntos pra passar dessa vez o que acha? E vamos pensar num curso que se pareça mais com você, um teste vocacional pra começar pode ser? Ela fez uma careta e depois acenou que sim. Os
dois papearam um pouco mais e decidiram comer cachorro-quente. E Dora não parava de perguntar sobre Ramos e sobre a vida dele.
− Então, Caio, filho de pastor, mais dois irmão suas sobrinhas, uma mãe fofa. E as namoradas, como eram, muitas? − perguntou ela bancando a segura pra ver se ele soltava algo sobre a tal Luísa.
− Affe! Não, nenhuma.
Dora arregalou os olhos e engasgou com a batata.
− Como assim, era tão feio quando adolescente. Tipo como? Gordo, espinhas e aparelho?
Ele riu mostrando a covinha.
− Não, tipo alto demais e meio seletivo. Não tinha menina bonita na região?
− Até tinha, mas eu só tinha olhos pra uma desde criança.
Ela deu um meio sorriso triste e disfarçou.
− Devia ser uma boa garota. Conta mais. Namorou com ela?
− Se uma semana conta, sim.
− E ela foi a única?
− Namorada pode se dizer que sim. Depois eu virei um garoto complicado. - piscou pra ela
− Sério? Humm… falou ela rindo e bebendo de canudinho dando dois passos pra longe dele o fazendo rir.
− É, ela foi embora da cidade e me deixou por eu ser jovem demais, inocente demais ou qualquer coisa do tipo e eu acabei indo pro lado negro da força.
− Se ela não disse porque foi, você também não pode julgar. Devia ter ido atrás pra perguntar.
− Aos 15 anos? Não. Ela tinha 23 na época estava na faculdade.
Dora engasgou de novo.
− Caramba! E nunca mais voltou a vê-la?
− Ahhh, então, vamos falar de outra coisa.
− Aquela loira. Era ela no dia em que eu… Não era?
Ele acenou que sim e também se lembrou como ela do amargo que foi aquele dia. Ela se lembrava do rosto e da sensação bem conhecida de saber que não estava a altura de uma mulher como aquela. Ela era só uma garota e a tal loira era A mulher na vida de Caio. De fato eles só poderiam ser amigos, o jeito mesmo era cortar as asas de suas borboletas. Caio não estava disponível era óbvio.
Ele tocou em seu queixo e capturou seu olhar no dele.
− Ei, eu já aprendi viu?
− O que?
− Os sinais do seu rosto. O que te deixou triste?
Dora suspirou, amassou o saco de papel do cachorro quente e o atirou na cesta limpando as mãos no guardanapo e tomando o último gole de refrigerante e tomou coragem pra confessar.
− Sei lá, eu vejo a Mel e o Rodrigo nesse novo amor tão lindinho e ouço a sua história tão bonita e triste. E penso que queria algo assim pra mim. Não de um irmão truculento, tadinho do Juliano, me impedindo de ser feliz ou de um cara me abandonar, mas… Sabe, conhecer alguém de verdade, partilhar, caminhar, ser conduzida, ensinar e aprender, um abraço bem dado e mãos que simplesmente se encaixam. Ahhh, não sei, leio romances demais!
Ele olhava pra ela encantando bebendo suas palavras, este era seu sonho de relacionamento. Ela notou o jeito estranho que ele estava olhando pra ela e riu.
− Que foi? Tá me achando patética, não é?
− Não eu jamais zombaria de sonhos tão puros. E tenho certeza que vai realizar todos. - falou ele tocando de leve o queixo dela com o dedo indicador. - Certeza absoluta. O barulho do pessoal do circo capturou sua atenção e ela se pôs de pé pra ver, uma labareda de fogo alto subiu e depois outra.
− Ei, vamos lá? É o circo!
− Vamos!
Eram tantas cores as pessoas se aglutinavam em volta pra assistir o espetáculo que era bem divertido e interativo, toda hora eram convidados os transeuntes pra se juntar a alguma apresentação, ou então interagiam em brincadeiras em grupo. Como agora em que passavam lenços gigantes sobre a plateia feliz e pediam que ficassem em roda e descalços, era uma brincadeira de roda com lenços, onde as pessoas trocavam de pares e dançavam com os lenços enrolando as pessoas. Uma senhora ao ver a animação de Dora e Caio que só observava a brincadeira se ofereceu pra segurar as coisas dela.
− Vão se divertir meus queridos, tá na idade, deixa que eu seguro suas coisas.
− Ai obrigada, tia. - disse Dora dando um beijo estalado na senhora.
− Os óculos, não vai querer perdê-los lá.
− Verdade. − falou ela entregando e puxando Caio pela mão pra dentro da roda
multicolorida, eles riam rodavam se perdiam e se achavam na roda, um palhaço cismou com Dora no meio da roda e lhe entregou uma rosa, ela tentava fugir, se perdendo de Caio, mas ele a tinha sempre sob seus olhos e via toda a perseguição do palhaço enquanto girava para outras bandas. Ele se aproximou dela sem que ela percebesse e ela trombou nele com toda força e ele a segurou acima dos dois um tecido laranja que passava um pouco de luz entre os tons de amarelo e azul dos outros, um faixo de luz bateu bem nos olhos dela focando-os.
Caio tossiu pigarreando forte pro palhaço entender e prendendo o riso da façanha dela e ficou de pé ao lado dela.
− Oh palhaço que negócio é esse de dar flor pra minha mulher! - falou com aquela voz firme e rouca deliciosa dele.
O palhaço inclinou a cabeça e sorriu para o casal pedindo um beijo dos dois e logo as pessoas começaram a pedir aos aplausos e gritos: Beija, beija, beija! Dora arregalou os olhos em pânico.
Estavam tão próximos e com a respiração acelerada da brincadeira, perderam a noção de tempo se olhando ali. Ela não sabia o que era mais alto o som das vozes pedindo um beijo ou seu coração pulando dentro do peito, ali nos braços de Caio no meio da multidão perdida e achada nos olhos verdes intensos dele. Caio não percebeu como havia feito aquilo, foram as cores, a forma como ela praticamente caíra em seus braços, ele não fazia idéia. Simplesmente seus lábios ternos cobriram os dela delicadamente, como um pouso delicado de beija-flor sobre a pétala, e embora a intenção fosse inocente de acalmar a platéia, algo os incendiou, e ele percebeu que queria muito aquilo, de verdade. Ele se recompôs em meio aos aplausos de contentamento e a olhou nos olhos profundos notando pela primeira vez que eles eram castanho dourados e a pegou pela mão. - Vamos sair daqui. - disse num suspiro pesado sorrindo saindo correndo com ela do meio daquela roda.
Ela de nervoso não parava de rir e perdera as forças pra correr e o soltou.
− Vamos! - disse ela recuperando o fôlego com urgência para sair de perto das pessoas que aplaudiam a cena dos dois e ele todo serelepe se curvando agradecendo, ela viu que ele levara na brincadeira aquele momento em que ela se deixara levar inebriada por aqueles lábios que ainda sentia queimar nos seus, sem se dar conta estava rindo, rindo muito e alto. Era ironia e alegria demais, ser beijada por acidente daquele jeito.
Caio adorava ter provocado o riso dela, melhor que a habitual fúria, ambos riam da situação ele pegou em sua mão.
− Tá tudo bem?
− Tá, agora tá! Meu Deus isso foi engraçado. Era mais fácil ter corrido a ter me beijado. Desculpa por te fazer passar por isso. - falou Dora tendo certeza que ele só faria aquilo por pressão. Ela queria acreditar que era real, podia se ferir acreditando. Ele ainda podia amar Luísa, não? Mas aquele beijo seria dela, só dela e de mais ninguém.
Ele sorria olhando pra ela. Que desculpar o que! Ele queria era beijá-la de novo e de verdade dessa vez, ainda mais agora que ela ria lindamente sob o sol daquela tarde deixando ainda mais dourado os seus olhos, morena sua pele refletida pelo amarelo de seu casaco. Ele olhava pra ela tentando encontrar um significado a mais nos seus olhos também. Era diferente dos insondáveis azuis de Luísa. Dora era pura, bela e transparente, travava em si uma guerra por não crer em si mesma como mulher, insegura na autoestima, com ainda muito na vida pra descobrir. Era um botão de flor, uma margarida talvez, pois continha esse tom modesto e simpático de alegria facilmente amigável. Ele controlava a respiração e o impulso que ordenava que ele a beijasse novamente, mas dessa vez não teria volta e nem justificativa, não seria um mero acidente, seria de propósito e ele queria ter certeza que quando o fizesse teria permissão pra tal ato. Ele fora covarde ao deixá-la pensar que o beijo fora meramente acidental e que não havia nenhum desejo ou reciprocidade, porque havia, mesmo que ele não quisesse admitir em voz alta.
− Vem, vamos pra casa, risadinha. Que bom, que está feliz.
− Caio. - chamou Luísa atrás deles ao que ele imediatamente soltou a mão de Dora que ao olhar pra Luísa, perdeu o riso aos poucos. Era aquela a mulher que ele fora apaixonado? Fazia muito sentido ele ser só amigo dela mesmo. Quem em sã coincidência trocaria aquela mulher por uma simples babá desengonçada.
− Luísa esta é…
− Dora! Acho que me lembro de você. - antecipou-se Dora se recompondo, dignidade e orgulho eram um traço forte que herdara de sua mãe, respirou fundo e encarou Luísa de frente.
− É, prazer finalmente conhecê-la em melhores condições. Meus pêsames.
− Obrigada, ah… Caio eu vou indo pra casa, fica com a Luísa vocês devem ter muita coisa pra conversar.
− Ei Dora espera. Está tudo bem?
− Claro, vai lá eu estou um pouco cansada, querendo um banho e uma cama. Vocês ainda tem muita coisa pra resolver não vou atrapalhar.
− Mas…
− Vai! Depois a gente se vê. - falou Dora sorrindo de olhos tristes. Ela foi pegar as coisas com a senhora que a ajudou, pôs os óculos a bolsa e com as sandálias nas mãos correu de volta pra saída.
Luísa ficou olhando Caio avistar Dora ir e se aproximou receosa.
− Te criei problemas? - perguntou ela.
− Não sei, acho que eu mesmo ando criando alguns.
− Gostei do cabelo. Era como usava antes, mas seu rosto mudou.
− Luísa, tenho uma coisa pra te perguntar. - ele virou-se pra ela.
− Claro.
− Ele voltou a te procurar? Alguma vez te encontrou? - ela fugiu com os olhos. - Luisa!
− Uma vez.
− Desgraçado!
− Relaxa, ele nunca vai me achar aqui.
− Como você sabe?
− Viajei demais, outros países. Ele nem deve saber que estou tão perto.
− Preciso que tenha cuidado e me fale se alguma vez ele entrar novamente em contato. Tá me entendo?
− Porque isso de repente?
− Sonhei com você.
Ela sorriu, ele não.

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